a praga mais bonita que já entrou em mim
tua beleza não justifica o feitiço ruim que me jogou
te trisca de mim.
não quero te xingar. nem se eu conseguisse. mas te trisca de mim. me deixa. te arreda. porque tu me envenenou.
não sei que canto foi aquele, mas era doce demais pra não esconder alguma coisa. tu veio mansa, como quem não quer nada, e deixou tua voz dentro de mim feito uma reza torta. e agora tudo em mim embrulha quando te escuto. até o sangue gira errado.
eu não sei o que tu é. mas tu tem um troço, uma coisa que se aloja. um bicho. um feitiço daqueles bem ruins que não fui eu que pedi, mas deixei entrar. tenho culpa.
tu me olhou como se não fosse nada, mas o rastro que tu deixou não tem nada de leve. tem desequilíbrio, tem silêncio com veneno.
eu nem quero te acusar de nada. não quero montar altar pra dor. não quero fazer escândalo com o que foi só meu. mas eu te digo, daqui, com toda a firmeza: tu és perigosa.
tu me confundiu. não com palavras, que tu fala bonito até demais. mas com o jeito que somes, o jeito que não sustentas nem o fio da presença. e olhe bem… eu não te odeio! te adoro até demais. eu não quero mal nenhum pra tua cabeça. mas quero distância. porque o que tu carregas... desestabiliza. e eu tô me limpando. tô tirando teu nome do corpo com sal grosso.
e mesmo assim eu te protejo. eu ainda te protejo. não falo teu nome, não rasgo teu retrato. porque proteger é coisa que se aprende quando se cresce sem ser protegida. lembras disso de mim? sei lá se lembras… nem pareces real, mulher.
mas não te confundas: te protejo, mas te quero mesmo é longe. te arreda de mim! desfaz esse laço que tu nunca soube honrar, mas amarrou mesmo assim.
que os ventos te levem leve. mas que não voltem com teu cheiro. porque minha alma cansou desse canto da sereia e o planta-veneno.
mas vem cá, me responde uma coisa: que raio de coisa és tu? tu falas bonito em melodia, falas feito quem toca no invisível… mas por que é que tudo em ti parece desconectado? consegues tocar os outros com uma arte da comunicação e não consegues olhar nos olhos de quem te admirou um dia. falas tão mal e tão bem.
tu me trisca de um jeito que não me parece físico, mas entra. me envenena. e sabes disso? tu tens consciência? ou só existes assim, dispersa, sem se ligar no que carrega, no que solta, no que deixa preso nos outros?
fico até me perguntando se fui eu que inventei. eu me encantei sozinha? será que tudo isso foi só um feitiço meu, jogado contra mim mesma?
é que também não faz sentido alguém como tu, que comunica com o mundo através da beleza, ser tão ausente quando se trata de uma conversa de verdade. tão incapaz de manter um laço, de sustentar um fio.
que é que aconteceu contigo? tu desaprendeu a vibrar com outro ser humano? deixa que eu ouça tua história… talvez tu só passe e vá deixando um rastro nos outros que nem olhas pra trás pra ver.
serpente não morde gritando. ela chega devagar. se enrola. dança bonito no pé da cama. maldita e encantadora.
me diz, foi de propósito? ou nem sabes o que carregas? sabes que tua presença mexe, desequilibra, deixa rastro? tu tens ideia do que tua ausência faz? ou só andas por aí largando pedaços de ti nas pessoas, feito quem troca de pele e nem olha onde a antiga ficou?
entrou em mim pelo olho, pelo ouvido, pela curiosidade. e agora eu carrego teu soro no sangue. e dou risadas! que se escutem as minhas risadas!
minha musa, que os encantos que carregas voltem pro mato. que tu te encontres com teus iguais. mas que não voltes aqui. aqui não! e que os deuses ouçam: protejam o meu corpo da tua presença. e me livrem de todo encanto mal-intencionado que vem coberto de brilho. que eles te protejam também, mas que não te tragam de volta. que tu aches teu eixo, mas longe de mim. nem toda beleza é bênção.
mereces amor, tu és digna desse amor que buscas com tanto desespero que não enxergas que machucas quem te vê como realmente és. e te aceita, mas não concorda.
Que texto maravilhoso. Parabéns! Eu já quis dizer exatamente isso para alguém, mas infelizmente eu não tinha as suas palavras!
me arrepiei